domingo, 15 de fevereiro de 2009

Sementes

Abre as janelas e vê o vazio das ruas, o silêncio da manhã lhe assusta, acostumará com as buzinas, sirenes e anúncios. Sentia-se acompanhada. Saía cedo com as sacolas nas mãos e no porta moedas a lista de compras, desejava ouvir uma voz amiga, mas seus ouvidos apenas capturaram gritos desconhecidos.
Sabia que acabaria assim, aos poucos todos foram indo e só ela ainda mantinha seus hábitos, destemida enfrentava o peso dos seus anos, andava na contra mão e gesticulava com braveza para quem lhe chamasse a atenção. Não gostava de piedade, gostava sim, de pão de queijo.
Estranha ou não, ela tinha alguns modos não muito convencionais, deixava todas as luzes acessas durante o dia, acreditava que assim economizaria tempo em acendê-las novamente mais tarde, marcava com um ponto as páginas lidas do livro, por fim, percebeu que reiniciou sua leitura várias vezes e que nunca se lembrava do que havia marcado, mas sim apenas dos finais.
Desistiu do diário, achou melhor guardar suas experiências na memória, gavetas são muito perigosas para a vida. Ela pode ser invadida e devorada por ratos e baratas ou, simplesmente, mofar com o tempo. Já na memória era terreno fértil para sua imaginação, brotavam sementes de todas as espécies, frutíferas e daninhas dividiam o terreno sem muitos cruzamentos entre raízes, cada qual no seu neurônio quadrado.
Ela que construiu seu castelo de vida com tijolos de desafio, aprendeu ganhar e perder, mas aprendeu acima de tudo que todo tijolo numa construção é importante, o quebrado existe para alertar ao inteiro o perigo de se estar no lugar e hora errados, sendo assim, a vida vai se construindo em experiências e recordações, cabe a cada um o discernimento nas escolhas. Toda semente é capaz de brotar, mas poucas são as espécies que resistem e dão bons frutos.

5 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom este texto! Seu narrador faz a gente ser sugado para dentro de seu personagem.
Parabéns, Luciana.
Beijos, amiguinha.

Anônimo disse...

Que bom te ver de volta...senti sua falta!
Belo texto minha linda e doce mocinha!
Beijo com carinho e desejo de sucesso.

Unknown disse...

Olá...
É bom ter voltado a postar novos textinhos, há muito não deixava aqui meus pedaços de pensamentos, os dias acalmando em minha vida e as palavras voltando, com elas o prazer de receber visitas tão queridas por mim...
Beijo especial a vocês...

Narradora disse...

Mais um texto belo!
Beijo.
Ps:Também adoro pão de queijo.

Narradora disse...
Este comentário foi removido pelo autor.